sim, porque eu costumo ter muitos motivos pra viajar... mas descobri que não se precisa de motivos...
aliás, não se precisa de motivos, ponto, não importa sobre o quê.
Este blog foi criado em dezembro de 2005 pela própria Adriana, quando descobriu que estava doente, para manter todos informados sobre o seu tratamento, e acabou não sendo levado adiante na época. Desde que ela morreu, em 24 de agosto de 2006, venho fazendo aqui algumas postagens e gostaria de compartilhar com todos as referências às "memórias de Adriana".
2 comentários:
Objectiva, Seca e Adorável...
simplesmente.
Nunca Mais Soube Nada de Ti, Márcia.
Contexto
Portugal, Trofa, 26 de Maio de 2012.
Tantas lembranças, memórias e recordações, tantos cacos de cristal no chão do estômago, essas fotografias amarelo-negras nas paredes do tórax, e esses recortes de muitos jornais, neurocirurgicamente separados e tão espasmodicamente reagrupados.
Lembrar de amores que desapareceram na correnteza; lembro-me de ter tocado, furtivamente, o teu cotovelo enquanto me contavas um fracasso emocional dos teus. Passo as mãos no topo, vazio, da minha cabeça, a lembrar do tempo em que reclamava de ter que cuidar da cabeleira. Lembro, também, vagamente, um por-de-sol nas pedras nuas da praia, tuas costas douradas, tuas costas desertas, tuas costas a destilar o sal.
Recrio na boca o seco absoluto do (palato) planalto central e bebo rios de olhares à minha volta... é como se todos os que amei estivessem, sempre, a flutuar sobre a minha cabeça, a cuidar-me, a guardar-me, a impedir-me de esquecer. Recupero nas narinas as cascas das laranjas que descascava para ti, as sardinhas, as rosas, os enterros e a chuva a pesar nos ombros.
Dei meu coração e, alguns, esqueceram-se de lhe dar corda. Abri o meu peito e, muitos, não me quiseram habitar. Muidei meus hábitos alimentares e comi meus amores (perfeitos) até vomitar (bulimia romântica). As memórias a serem regurgitadas e a trazerem à boca o ácido da perda, o oco do esquecimento (alzheimer romântico) e tantas vezes fui eu outros, tentando ser eu mesmo.
Ao fundo, em crescendo, ouço as 33 variações sobre uma valsa de Diabelli, de L.W. Beethoven, versão do Uri Caine. Lembro-me de passar uma enormidade de tempo a olhar para o diamante no pescoço de Bastet, no British Museum. Templos inteiros, paredes, tectos, mosaicos, uma profusão de expressões, um excesso de formas.
Podes beijar-me ou dar-me um beijo, a opção é tua, escolhe tu que eu deixo; ou, por outro lado, podes, simplesmente, beijar-me. Só quero isso, assim, simples e excessivo, um beijo, nem que seja magro, seco (anorexia romântica), roubado (cleptomania romântica), um beijo que desidrate a minha saliva.
Paulo Acacio Ramos
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